quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Nas Margens do Almada Eu sentei e Chorei



Roque Passos

Nas margens do Almada eu sentei e chorei.
Chorei o exílio dos meus filhos, expulsos pela falta de trabalho.
Chorei pela hipocrisia daqueles que prometeram realizar os nossos sonhos, mas nos deram pesadelos.
Chorei a dor das mães que viram seus filhos tragados pela violência, porque foram esquecidos por aqueles que tinham o dever de criar oportunidades.
Chorei ao ver a forma irresponsável e traiçoeira com que trataram os meus recursos, destinados a ofertar melhor qualidade de vida a minha gente.
Chorei com os pescadores e as lavadeiras, que buscaram no Almada o seu sustento e se depararam com uma água fétida, apodrecida pelo abandono e maus tratos.
Chorei ao ver minha gente cabisbaixa, humilhada por aqueles que deveriam ser guardiões de sua dignidade.
Nas margens do Almada eu sequei as minhas lágrimas, ao ver a juventude unida, tomando em suas mãos o próprio destino, para reconstruir a nossa terra.
Nas margens do Almada eu voltei a sorrir.
Lembrei o quanto sou forte e capaz. Sou Coaraci, a Terra do Sol, de uma gente que não se entrega, não abre mão dos seus sonhos, pois são legítimos, justos e verdadeiros.
Nas margens do Almada eu vi a esperança renascer.

domingo, 9 de setembro de 2012

A verdade da Chuva


Roque Passos

A chuva que cai agora
Não consegue molhar a Terra,
Seca por tanto egoísmo.
O vento frio que vem com ela
 Não afeta o meu corpo,
Protegido por um velho
Mas aconchegante agasalho de indiferença.
Talvez não seja um vento tão frio.
É apenas uma leve brisa.
Leve, mas com um poder assustador.
Capaz de intensificar a frieza
Da alma que habita o meu corpo.
Os sorrisos não mais me encantam,
As palavras não me convencem,
Os abraços não me comovem.
Vivo a canção do Arnaldo:
Suplico um sentimento qualquer.
Qualquer um
Que me leve a me encantar com os sorrisos,
Mesmo que sejam falsos;
Iludir-me com as palavras,
Maliciosamente escolhidas.
Um sentimento que me faça de novo ter sonhos,
Acreditar nas pessoas,
Ser ingênuo, tolo, emotivo... humano.


quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Eu sou


Sou o vento intempestivo
Que sabe impingir implacávelmente a sua força.
Sou o vento impetuoso
Que acaricia as flores com ternura,
Beija com carinho os rostos cedentos de amor e paz.
Sou os raios de Sol
Que iluminam os escuros e profundos poços das almas solitárias,
Derretem as geleiras, aquecem os corações que acreditam no amor.
Sou um filho do Cosmo, partícula sublime da Mãe Terra,
Que busca através dos erros, aprimoramento dos acertos,
Descobrir, entender e cumprir o dom que A Sabedoria Suprema do Universo
Me concedeu: viver.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Profissão Perigo - Parte ll

Por: Roque Passos


As duas se encontraram quando voltavam para suas salas. Já havia dois dias que não conversavam, uma eternidade para elas. O intervalo de vinte minutos passara voando, mal deu para tomar uma xícara de café.
- Amiga, que batom maravilhoso! Hum... Como você tá magra.
- São seus olhos querida. Você que está com um corpo espetacular.
Ah, você soube da Dona Astrogilda? Perguntou a professora de Biologia.
- Não, menina. Aconteceu alguma coisa com ela? Indagou a colega de Matemática.
- Ai, amiga. Você não imagina o que "Eles" fizeram com a pobre.
- Meu Deus do céu, "Eles" a fuzilaram? Por favor, por tudo que é mais sagrado, me diga que não. Suplicou a professora, levando as mãos à boca.
- Quase isso, minha linda. Reclamaram que a sopa estava sem sal. Ela disse que o tempero tava no ponto, que devia ser o paladar deles...
- E ai menina? Interrompeu a colega, cheia de expectativa.
- "Eles" resolveram fazê-la experimentar a sopa. A arrastaram até o caldeirão fumegante. Quatro deles a seguraram com uma força descomunal, enquanto os outros em circulo gritavam em coro: " faz ela beber, faz ela beber, faz ela beber, faz ela beber"...
- Por Deus, não! Gritou a colega em desespero.
Já com lágrimas rolando, a professora prosseguiu:
- Seguraram a cabeça dela tão firme, que a coitada não conseguia mexer nem os olhos...
- Jesus, Maria, José. Pelo amor do Altíssimo, salvem essa pobre. Rezou em desespero a colega de Matemática, como se estivesse presenciando tudo.
- Ninguém veio salvá-la. Nem Maria, nem José... Enfiaram a cabeça da Astrogilda no caldeirão em chamas... Meu Deus! Ela tentou se livrar: mexeu as pernas, tentou soltar os braços. Mas "Eles" a detiveram com uma força luciférica. O líquido, que mais parecia magma oriundo das profundezas do núcleo, penetrou pela garganta da pobre em direção aos pulmões, dilacerando, destruindo todos os tecidos...
- Por favor, pare. Eu não aguento ouvir mais. Suplicou a colega.
- Agora, ela está lutando para se salvar,em uma cama de um hospital público, que nem médico tem para acompanhá-la.
- Chega, chega. É muita crueldade.
- Mas não acabou. O pior é que a pobre nem imagina que foi demitida.
- Não. Você tá mentindo.
- Juro por essa luz que meus olhos cansados de tantas leituras e correções conseguem enxergar.
A professora pensou na senhora de sessenta e três anos, quarenta dedicados ao colégio, demitida, enxotada como se fosse uma criminosa. Vivendo o pior momento de sua vida, sendo atacada justamente por aqueles à quem sempre dedicara tanto amor. Não gerara nem um fruto em seu ventre. Por isso, considerava "Eles" como seus filhos.
Desprovida de sentimento de posse, por várias vezes usou seu mísero salário para incrementar o lanche com ingredientes mais saborosos.
- Não compreendo. Por que a demitiram?
- Aqueles, você sabe quem, fingiram ter passado mal e alegaram que foi o lanche. A acusaram de tentar envenená-los. Ela pode até ser presa... se sobreviver, é claro. Concluiu a professora, secando delicadamente as lágrimas com um lenço de papel que a colega lhe estendeu.
- Que loucura. Jesus, em que mundo  nós estamos. E eu que quase obriguei um deles a tomar um copo de mingau.
- Ainda bem amiga que você não fez isso. Eles estão se infiltrando em todos os lugares. Nossa Direção... você sabe. Está sobre o controle deles...
- Pare, já chega. Só pode ser um pesadelo.
A pobre da Astrogilda, que sempre se sacrificou para oferecer o melhor lanche à todos, "Eles" fizeram isso, imagine o que não farão com nós, que vivemos cobrando deles tarefas de casa, provas...
- Ah, minha cara amiga. O tempo de nós cobrarmos alguma coisa deles acabou. "Eles" estão assumindo o controle. Precisamos nos defender da melhor forma possível.
- Como o Cleiton? Viu só o que aconteceu com ele?
- O professor da armadura de aço?
- Ele mesmo. A Administração o proibiu de usar a armadura. Disseram que era uma ameaça à segurança de você sabe quem. Como ele se recusou, foi suspenso e agora uma sindicância vai apurar a acusação de que ele estava tentando matá-los.
- Temos que fazer alguma coisa. Recorrer a alguém, pedir ajuda a Secretaria.
- Que Secretaria? Tá delirando? Não tá vendo que a Administração está invertendo tudo? 
As vítimas são tratadas como vilões, os vilões como vítimas. Olha os exemplos da Astrogilda e do Cleiton...
- Meu Deus...
- É, só Ele mesmo para nos socorrer.
Lembra do professor de Artes, que atuava no Fundamental II?
- Sim. Ele não foi transferido para aquele colégio conhecido como zona da morte?
- É. Mas você sabe porque ele foi transferido?
- Ah, soube que ele pediu para sair. Não se sentia mais a vontade trabalhando aqui.
- Ai, ai. A história real não é bem essa.
- Então, o que aconteceu de verdade?
- Um de "Eles" mandou o professor enfiar as duas mãos no... bem...você sabe... naquele lugar e bater palmas...
- Não acredito. Que absurdo. Mas esse você sabe quem já foi punido exemplarmente?
- Tá querendo fazer graça com a situação, amiga?
Ele levou o caso à direção. Sabe o que ouviu?
- Uma palavra de apoio, pelo menos.
- Apoio? O Diretor disse que é preciso ter paciência, que é normal, são coisas da idade.
- O que? Só pode ser brincadeira. O Diretor falou mesmo isso?
- Falou sim. E nem chamou você sabe quem para conversar.
O professor recorreu a Secretaria. Aqueles que fingem administrá-la, disseram que a culpa era toda dele. Que a linguagem e as atividades aplicadas na aula estavam excitando "Eles". E que para o bem dele e, principalmente, de "Eles", o certo era transferi-lo.
- Mas o mandaram para a zona da morte.
- Sem o apoio do Sindicato, nem dinheiro para contratar um bom advogado, ele desistiu de recorrer a justiça.
- É amiga, temos que....
A professora achou melhor não prosseguir, ao perceber um par de olhos sombreados à espreitá-las pelos corredores.
- Vamos logo para as nossas salas. Ou melhor, as salas  de "Eles". Antes que a Secretária Particular do Diretor nos acuse de conspiração contra você sabe quem. 



segunda-feira, 5 de março de 2012

Mulher

Por: Roque Passos

Há uma magia que se mostra no olhar.
A beleza encantadora num gesto simples: o mover delicado e inconsciente da mão para recolocar no lugar um teimoso fio de cabelo, que insiste em se desprender.
Seu caminhar é suave e forte. Um encontro alucinante entre a leve brisa, que baila acariciando os delicados rostos, e a onda do mar, que com sua força desmedida, nos seduz e abandona ao chão.
É vista como um ser frágil, mas sempre surpreende com sua capacidade de superar os maiores desafios.
É múltipla no ato de acolher: mãe, filha, irmã, esposa, sacerdotisa, amante...
Tem o poder de nos dominar, nos enlouquecer; levando-nos ao êxtase ou as profundezas mais obscuras da alma.
Sua paixão é intensa, avassaladora, contagiante. Seu amor pode até ser egocêntrico, mas não discriminador. É capaz de amar a todos; entregar-se de corpo e alma, até mesmo para a sua semelhante.
É bela e graciosa, sensata e louca.
É o começo, continuação e a maior esperança de perpetuação da vida humana.
É rainha, plebéia, princesa.... Mulher.

8 de Março

Por: Roque Passos

Ouço gritos que arrepiam a alma.
Labaredas se misturam com as chamas da paixão, que aquece os corações sedentos de amor e justiça. Dilaceram as peles de diferentes cores, que um dia macias, tornaram-se ásperas e secas pela fuligem de uma luta árdua e não valorizada.
O céu é tingido pelas cinzas negras de corpos que brotam das chaminés fabris; o chão manchado por sangue escurecido pelo calor; o ar, dominado pelo cheiro de desespero e sofrimento.
Ouço gritos que vem das ruas e das casas.
São de pais, filhos, irmãos, maridos, amantes, que vão conviver com a dor da perda, da saudade que não passa, de uma espera que não tem fim. Suas mulheres não voltarão mais; foram tragadas pela ambição desmedida de uma sociedade insana.
Em meio as lágrimas, a força se renova, a luta se intensifica.
Oito de Março não será mais apenas um dia no calendário. Será sempre uma marca explícita na alma da humanidade; será o dia em que tudo começou.

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Você já disse obrigado?

Roque Passos

Quando acordou hoje, qual foi a primeira coisa que pensou? Qual a primeira palavra que pronunciou?
Talvez tenha sido: obrigado. Ou foi um pedido?
Deve achar que estou delirando, ou no mínimo sendo intrometido. Mas já parou para pensar que sempre que acordamos lembramos apenas do que queremos,seja para o dia que se inicia ou para os dias  que virão, e não atetamos para a necessidade de agradecer?
Ao ser  despertado pelos aconchegantes raios do Sol e a envolvente luz que ele transmite, ou pelo insensível despertador, lembre-se de agradecer. Agradecer por ter sobrevivido a mais uma noite escura e poder ver o nascer de um novo dia, pelo ar que invade os seus pulmões, pelo astro magestoso que ilumina o dia ou pela chuva que cai hora fina hora torrencial, dificultando o caminhar pelas ruas; agradecer pelas pessoas que te amam e te adimiram, porque elas te aceitam como você é, e também pelas pessoas que te odeiam e te invejam, porque no fundo elas cobiçam o que há de melhor em você. Agradeça todas as coisas que conquistou com muito esforço e persistência, são prova de que a luta valeu a pena; agradeça por tudo que deseja conquistar, isso prova que você ainda tem objetivos e eles dão significado a sua existência.
Ao acordar lembre-se de agradecer à Aquele Que Sempre Existiu, por ter criado esse Planeta maravilhoso, por fechar os olhos para a nossa ingratidão  e para a grosseria com que tratamos a Mãe Terra, e continuar nos dando o maior presente de todos: A Vida.
E então, você ja disse obrigado hoje?
Carpe Diem. 

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

É bom estar de volta

Roque Passos

O ano começou e me questionei se devia postar uma dessas tradicionais mensagens de ano novo. Decidir não fazer.
Dei um tempo para apreciar as belezas que A Grande Mãe nos deu e refletir sobre o quanto Ela é generosa com todos nós.
Mas agora é hora de retomarmos o nosso contato. E para iniciar o nosso "Ano Maia", escolhi um trecho de um poema extraído de um livro de Paulo Coelho.

" É bom dar quando alguém pede, mas é melhor ainda poder entregar tudo a quem nada pediu.
 E existe alguma coisa que se possa guardar? Tudo o que possuímos, um dia será dado. As árvores dão para continuar a viver, pois guardar é colocar um fim em suas existências.
E o maior mérito não é daquele que oferece, mas do que recebe sem se sentir devedor. O homem dá pouco quando dispõe apenas dos bens materiais que possui; mas dá muito quando entrega a si mesmo."

É muito bom estar de volta. Carpe Diem.